Crimes de adolescentes: até onde vai a culpa dos pais?

Os pais respondem civilmente pelos danos causados pelos filhos menores, ainda que não tenham participado ou mesmo sabido do ato.

Casos de violência praticados por adolescentes dentro de escolas têm se tornado cada vez mais frequentes e preocupantes. O que antes parecia algo isolado, agora revela um cenário mais complexo e doloroso: jovens que vivem uma realidade paralela, conectados a grupos de ódio em redes sociais, longe do olhar e da presença dos pais.

Esses episódios não impactam apenas a esfera criminal, mas envolvem diretamente o Direito de Família, a responsabilidade civil dos pais e, em casos extremos, até desdobramentos no Direito Sucessório.

 

Quando o menor comete um crime: o que diz a lei?

A legislação brasileira entende que menores de 18 anos são penalmente inimputáveis, ou seja, não podem ser processados criminalmente como adultos. Mas isso não significa impunidade.

Eles respondem por seus atos dentro das normas do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que prevê medidas socioeducativas — desde advertência até a internação.

E o ponto mais sensível: os pais respondem civilmente pelos danos causados pelos filhos menores, ainda que não tenham participado ou mesmo sabido do ato.

Conforme o artigo 932 do Código Civil Brasileiro:

“São também responsáveis pela reparação civil: I – os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia.”

E mais: o artigo 933 esclarece que essa responsabilidade é objetiva, ou seja, independe de culpa ou dolo. Basta que o adolescente tenha causado dano e esteja sob a guarda dos pais para que estes possam ser responsabilizados financeiramente, inclusive em ações de indenização por danos morais e materiais.

 

Grupos de ódio e a realidade invisível

Um ponto cada vez mais relevante — e alarmante — é o papel das redes sociais nesse processo de radicalização silenciosa.

Muitos adolescentes vivem uma espécie de mundo à parte, em contato com comunidades digitais de ódio, violência e ideologias extremistas, sem que os pais sequer saibam.

Um caso recente foi o da professora de inglês, de 34 anos, morta em sala de aula, em Canoas, no Rio Grande do Sul, no último dia 2 de abril.

Os autores do crime, três alunos de 13, 14 e 16 anos, segundo as investigações, tinham envolvimento com grupos violentos na internet, mas nada disso havia sido percebido pela família ou pela escola com antecedência.

Esse tipo de isolamento digital reforça a urgência de que pais e responsáveis estejam verdadeiramente presentes na vida emocional e digital dos filhos. A vigilância não é só física — é também afetiva, psicológica e virtual.

Na série nacional “Adolescência”, vemos pais diante do filho que cometeu um crime, sem terem notado qualquer sinal prévio. O enredo retrata com precisão a realidade de muitas famílias: o distanciamento emocional, a negligência inconsciente, o silêncio, a ausência.

Não é apenas uma ficção — é um espelho social. E reforça a urgência de falarmos sobre vínculos familiares, presença afetiva, escuta ativa e responsabilidade conjunta.

 

Direito de Família: além do sustento, o dever de educar

A Constituição e o ECA deixam claro: é dever dos pais garantir, além do sustento, o bem-estar físico, emocional, educacional e moral dos filhos. A omissão nesse papel pode ter consequências não apenas sociais, mas jurídicas diretas.

Em muitos dos casos mais trágicos, como ataques em escolas, investigações revelam negligência, ausência de diálogo, falta de acompanhamento psicológico e, principalmente, desconhecimento sobre os sinais de alerta que os filhos demonstravam antes dos atos.

Sabemos que não é uma tarefa fácil. Sou mãe e sei que estar no controle exige disciplina, organização, empatia e aproximação dos jovens que ainda estão construindo suas vidas e são alvos fáceis de criminosos.

 

Implicação no Direito Sucessório

Sim. Quando atos praticados por adolescentes resultam em mortes, ações de indenização podem ser ajuizadas contra os pais, e se os autores vierem a falecer posteriormente, o patrimônio deixado por eles poderá ser objeto de responsabilização.

Além disso, dependendo das circunstâncias, heranças podem ser discutidas judicialmente por herdeiros das vítimas, e valores indenizatórios podem ser buscados judicialmente contra a família do infrator.

 

Presença é o melhor caminho

Vivemos em uma era em que os filhos podem estar dentro de casa e, ao mesmo tempo, completamente fora do alcance emocional dos pais.

O cuidado com a saúde mental, o monitoramento das redes sociais e o diálogo constante são hoje medidas preventivas tão importantes quanto qualquer norma jurídica.

Pedir ajuda a profissionais de saúde, a exemplo de psicólogos, psiquiatras e psicoterapeutas contribui para auxiliar os pais nessa missão.

No campo do Direito, os pais continuam sendo figuras centrais, tanto para proteger seus filhos quanto para responder por seus atos.

Se sua família está passando por uma situação semelhante, ou você deseja entender melhor seus direitos e deveres como responsável, busque apoio jurídico especializado.

A prevenção começa no afeto. E a justiça, no cumprimento consciente dos nossos papéis.

Dra. Josânia Pretto